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sábado, 25 de maio de 2024

Miss Zombie

Senhorita Zumbi (Miss Zombie), 2013. Japão. De Yoshiki Kumazawa e Satake Kazumi.

"Devemos ter medo dos vivos, não dos mortos". Essa é uma frase que resume grande parte dos filmes de zumbis. Fido, Warm Bodies, Zombie plage são algumas das associações as quais não me esquivo em fazer.

Filme perturbador. Uma leitura sobre a morte como um estado de perpétua dor e tristeza. A exploração transcende até o pós-vida com o emprego de uma mulher zumbi para a realização de atividades domésticas. Como é de praxe as coisas saem do controle e dessa vez não estou falando de um apocalipse ou surto epidêmico; temos aqui a boa e velha cupidez do ser humano com forte ênfase sobre a violência do patriarcado. Algo do tipo: “Olha, um zumbi, vamos violenta-lo? É seguro, confia!”

Há um subtexto sobre a exploração dos imigrantes, mas subsumido pela temática de uma vivência aristocrática dentro de uma família comandada por um médico insensível. A desumanização do zumbi, como metáfora do estrangeiro, dá o impulso necessário à trama com a tematização do preconceito, da vida precárias e da violência sexual. O filme ingressa no terror pelo sofrimento de Shizuko, a esposa atenta para conduta libidinosa do marido. Além disso, seu filho, Kenichi, acaba se aproximando da criatura ao ser salvo de um acidente potencialmente fatal.

O filme vai constituindo uma cultura necrófila com constantes violações perpetradas contra a moça zumbi. Alguém aí se lembra de “Dogville”? Lar von Trier é você que está aí meu filho?


[Logo acima Nikole Kidman em Dogville, e mais ao alto Ayaka Komatsu em Miss Zombie, as semelhanças são maiores do que o esperado]

Além disso, a casa a qual a Miss Zumbi serve possui uma arquitetura lúgubre e semelhante a uma paisagem tumular. As construções parecem monumentos mortuários, aspecto reforçado pela fotografia preta e branca com gradações fugidias e contrastada por meios tons e pelos jogos de sombra. A luz do sol não consegue atravessar as nuvens opacas realçando o conflito entre o mundo dos vivos e dos mortos. À noite a ambiência torna-se mais desolada. Algo entre uma sepultura reaberta e uma favela terceiro-mundista.

O desenvolvimento da história apresenta furos, a comunidade adapta-se rapidamente a presença da zumbi. Todo modo, a verosimilhança construída é o suficiente, pois o plano geral consegue combinar o horror das relações familiares adoecidas com a proscrição e abandono imposto a alguns seres. A partir desses elementos entende-se a promiscuidade entre os vivos e os mortos.

Cotação: ☕☕☕

sexta-feira, 17 de maio de 2024

A maldição dos Mortos-Vivos

A maldição dos Mortos-Vivos (The Serpent and the Rainbow), 1988. De Wes Craven

Filme apresentado como “baseado em uma história real” (sei) e inspirado no livro do etnobotânico Wade Davis. É quase um crossover entre Monsanto e Madrugado dos mortos (espere sua vez Resident Evil).

O filme inicia-se com um olhar etnográfico colonialista e arrogante. É a barbárie haitiana pelo prisma da ciência ocidental. Desde o início The Serpent and the Rainbow busca o choque cultural como uma forma de horror. Identifica-se, inclusive, uma sútil influência do filme italiano Cannibal Holocaust (1980) de Ruggero Deodato: eis o gore antropológico.

Uma indústria farmacêutica decide enviar o antropólogo Dennis Alan para uma pesquisa (roubo) da substância anestésica utilizada nos rituais zumbis. Anteriormente, Dennis estava na Amazônia estudando (roubando) ervas medicinais de um Xamã. Embora o interesse do nobre pesquisador fosse o de salvar vidas, os financiadores mostravam-se mais interessados nos possíveis lucros. Onde os ingênuos veem um serviço à humanidade os espertalhões já preparam a impressão do código de barras...

De fato, nas décadas de 1970 e 1980 cientistas norte-americanos e europeus identificaram e apropriaram do patrimônio genético e ambiental dos povos amazônicos. O próprio livro do antropólogo canadense Wade Davis fez parte da exotização das Américas caribenha e amazônica.

O filme de Wes Craven conseguiu captar – mesmo que de forma não intencional – esse contexto, sugerindo até os interesses da biopirataria. Por isso a narrativa funciona muito bem em sua caracterização do Haiti como lugar terrificante. O cenário pula de um local assustador para outro, há exposição detalhada do que seria o universo cultural caribenho; velas, crânios, rituais sincréticos revelam um Haiti obscuro e primevo – mas capaz de cativar o interesse de turistas americanos.

Alan conta com a ajuda da haitiana Marielle Duchamp, apesar da formação médica ela acredita nas cosmologias locais. Juntos, eles devassam as redes de bruxaria para informarem-se sobre a droga. Acabam ganhando a contrariedade e o antagonismo do chefe da polícia política, mas isso não impede que Alan usufrua dos prazeres corporais oferecidos pela exótica dou-to-ra em uma cena de sexo tão brega com direito ao close no rosto da atriz na hora do orgasmo. Senhoras e senhores, eis Wes Craven nos anos 80!

[Corpos, bruxas e feitiços é o que não faltam]

Alguns aspectos merecem ser destacados. O filme contém uma narração em off do protagonista assemelhando-se a um caderno de campo (uma forma de reforçar os aspectos documentais do filme). O contexto político da ditadura de Baby Doc fundamenta a sensação de urgência e risco manifestada pelos personagens ao enfrentarem a bruxaria e a violência policial, ambas controladas pelo chefe dos Tonton Macoutes.

Mas quando a lua é focada em primeiríssimo plano o filme de terror se revela como uma peça bem urdida e o sobrenatural ou o supranatural rege o desfecho, os mortos-vivos aparecem como uma sofisticada metáfora dos presos políticos. A bruxaria não se compara às atrocidades cometidas pela ditadura haitiana, portanto a luta do bem contra o mal revela-se um propósito universal.

Mas infelizmente sou obrigado a relatar que o expediente do bem deve ser lido como o despacho da droga zumbificante para os laboratórios da Europa e dos Estates.

Todos os caminhos levam a Roma, digo, a Havard.

Cotação: ☕☕☕

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2024

O mal que nos habita


Critica a jato 


O mal que nos habita (Cuando acecha la maldad), 2023. De Demián Rugna.

Argentinos criaram uma própria versão de apocalipse zumbi ao tematizar acerca de um mal: os infectados ou infestados que se espalham de um lugar a outro.  As entidades são expressões da corrupção causada pelo demônio nas pessoas e nos animais. Um tipo de mal que se prende tanto nos lugares e nas coisas quanto nos seres vivos.

A narrativa inicia-se justamente com a identificação de um infectado em uma zona rural. Afastados da civilização, os moradores locais precisam lidar com o diabo em meio ao receio e à apatia das autoridades locais (altamente incompetentes pelo visto). No entanto, a medida em que a narrativa acelera a ritmo, o cenário se torna urbano com o senso de isolamento perdendo a importância, inclusive o deslocamento da cidade para o vilarejo parece se tornar mais frequente.

A fim de criar uma atmosfera de total impotência, muitos artefatos e aliados do nefasto vão aparecendo ao longo da projeção e, desse modo, o mal que espreita parece inevitável. Assim, animais, doentes, mortos e crianças tornam-se emissários do maligno, inexistindo adversários dignos ou capazes de enfrentar tal desafio. Acentua-se, assim, uma outra noção que é a do desespero, pois o mundo sem Deus não é necessariamente um mundo sem o diabo. A estética contida e a narrativa sóbria privilegiam o psicológico em detrimento do asco. Terror com toques de drama familiar: diante do adoecimento das relações afetivas, a solidão, a raiva, o abandono e, enfim, o enlouquecimento são a oportunidade aguardada para a materialização da maldade.

Não obstante um visual de terror requintado cuja âncora se dá na tragédia familiar – um psicologismo comum desses dias – há forte verve Trash na narrativa – não pela estética, mas pela facilidade com que desafios vão sendo acrescentados sem uma preocupação de amarrar muito bem a cosmogonia do universo apresentado. Um filme confuso e desequilibrado, mas capaz de, até certo ponto, assustar os desavisados com a lembrança de que se Deus está morto o diabo vai muito bem obrigado.

Cotação: ☕☕☕

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Zumbilândia


Zumbilândia (Zombieland), 2009. EUA. De Ruben Fleischer

Minha regra é: Não confie nas gentis donzelas.

Os zumbis estão na moda. Se há um significado mais profundo nessa constatação que aos leitores fique a tarefa de encontrá-lo.

Digo apenas que me divirto muito com essa nova onda de filmes, repetição nem tão descarada dos mesmos jargões das demais produções hollywoodianas. O individualismo, a busca da realização romântica como objetivo supremo e a o “amadurecimento interno dos personagens” permanecem como fios da narrativa.

O mundo foi ceifado pela praga dos mortos vivos, poucos são os sobreviventes, isolados e fadados a perambularem em um mundo no qual as tarefas mais simples e corriqueiras passam a demandar tantos cuidados (ir ao banheiro público e não ser atacado se tornou uma nova regra para sobrevivência). Trata-se de uma terra de ninguém, onde as pessoas podem expressar seus lados mais obscuros e sombrios.

Ou não, pois o bom mocismo parece prevalecer, mesmo que de forma irreverente. Columbus continua sendo o mesmo patético e assustado nerd que, apesar de ter uma habilidade incomum para prever perigos e coordenar o caos (através de suas regras), não consegue resistir aos encantos da vigarista Wichita, que adora armar ciladas para o sexo não frágil, sem se importar muito com as conseqüências dos seus atos. Tudo isso em nome da autopreservação e da sua querida irmãzinha, Litle Rock.

Já Tallahassee repete o arquétipo do cara durão que desconhece o medo, mas que bem no fundo tem uma alma sensível. Apesar de corajoso e destemido, seu quase parceiro (Columbus) o arrastará para situações inusitadas, exigindo desse Crocodilo Dundee do século XXI a máxima excelência em extermínio dos zumbis.

A direção é hábil, conseguindo criar boas piadas ao explorar novos aspectos do gênero, ironias com alguns dos jargões mais característicos, não passando jamais dos limites do “irreverente mas comportadinho”. O roteiro aponta os clichês dos filmes de zumbis e até certo ponto se recusa a segui-los. No entanto, a velha cartilha da comédia romântica está presente dando um forte tom a composição. Em um mundo no qual os mortos andam, o nosso herói (Regra n. 17: Não seja um herói) parece mais interessado em se despir da sua virgindade do que respeitar as sábias regras do seu manual de sobrevivência.

O capítulo final, no qual os protagonistas enfrentam os mortos vivos em um parque de diversões, revela-se eficaz do ponto de vista dos filmes de zumbis. Trata-se da exteriorização de uma evidência: os mortos vivos deixaram de ser um gênero de horror acessível aos iniciados para cair no gosto do público geral. Nada mais apropriado do que esse cenário para o conflito derradeiro. A cantilena básica da fragilidade feminina, no entanto, é “revisitada”, mocinhas espertas, mas que precisam de cavaleiros e suas espadas para serem salvas.

O ciclo se fecha com a promessa de uma unidade familiar, mesmo que atípica. Porém, o clímax (apesar de satisfatório) não consegue rivalizar com um dos atos anteriores, quando um famoso ator hoolywoodiano é visto no bairro das celebridades, gerando umas das seqüências mais divertidas da projeção.

Desejo sutil de iconoclastia X saudosismo pelas décadas passadas. Está aí a nova fórmula desses sucessos sazonais. Zumbilândia não é perene, mas convence (confiram, por exemplo, Adventureland).

Tiros, pancadaria em cima dos mortos vivos, montanha russa, twinkies, frases de efeito e a eterna busca pelo rabo de saia. Nada faz muito sentido, e nem precisa.

Talvez Hollywood queira nos dizer que no mundo do entretenimento já aceitamos nossa condição de zumbis, passivos e não pensantes, sempre dispostos a sair do cinema com um sorriso bobo nos lábios.

Cotação: Bom.

29 de janeiro de 2010

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

A Noite dos Mortos Vivos


A Noite dos Mortos Vivos (Night of Livind Dead), 1968. EUA. De George Romero

Você já leu Max Weber?

Eu nunca li, ao menos não de todo. Alguns trechos, capítulos, excertos. Tudo bem, ninguém é obrigado a ler Max Weber. No entanto, não parece ser intelectualmente honesto citar um autor sem conhecê-lo: sem dúvida, muitos comentam seus textos, mas poucos, de fato, já o estudaram.

Nunca havia assistido a “obra prima” de George Romero, não obstante meu interesse pelos filmes do gênero – confesso que várias vezes citei seu estilo e sua contribuição, um tanto inadvertidamente agora reconheço. Mas parece que não estou só, há tantos equívocos já ditos sobre A Noite dos Mortos Vivos... há mesmo certa supervalorização, e quando vamos a película não há como esconder um desapontamento.

As linhas gerais permanecem (eu já havia assistido o remake da década de 1990), Barba e seu irmão vão ao cemitério visitar o túmulo do pai, mas lá são atacados por um cadavérico, o rapaz morre e a jovem se vê sozinha. Ela caminha até uma casa erma, onde irá encontrar outros sobreviventes.

O primeiro aspecto que chama a atenção é a propalada idéia de que George Romero não dá uma explicação para o aparecimento dos zumbis. Wrong! Ele dá sim, inclusive insiste nisso, não de forma clara e evidente. Mas a chave do problema está lá, comenta-se acerca de uma radiação ou poeira vinda do espaço que seria responsável por trazer a vida aos corpos recém-falecidos. Algo que Ed Wood já havia falado em Plan Nine from Outer Sapce... As barreiras entre o trash e o Cult são tênues Mr. Spock, muito tênues...

O desenvolvimento dos personagens é mais rasteiro do que se pensa, Barba fica em estado de choque e não percebe os conflitos estruturados em torno da casa – sua contribuição ao desenvolvimento da narrativa é pífia. Outro conceito difundido é o de que George Romero mostra que o perigo não só ronda o lado de fora, porém isso é feito com muito menos habilidade do que em outros trabalhos que abordaram esse tema.

As constantes transmissões televisivas (os personagens presos na casa ligam um aparelho) diminuem a sensação de caos e isolamento. A sensação de um Estado capaz de administrar o levante dos mortos é mantida, algo que enfraquece o impacto dramático. Os filmes mais recentes desenvolveram essa premissa de forma muito mais intensa, vide Extermínio ou Madrugada dos Mortos, para ficar nos exemplos mais fáceis.

Não que a intenção seja desmerecer a triologia de Romero (Despertar dos Mortos ainda não assisti), mas o culto aos seus filmes se mostra mais importante para o gênero mortos-vivos do que seus próprios filmes. Além do que suas produções recentes são constrangedoras, isso para não dizer medíocre.

Mas, há muitas boas idéias em A Noite dos Mortos Vivos, o argumento de um conflito civil está presente. Um dos protagonistas é um negro, personagem ambíguo, cujo relacionamento com Barba pode dar a entender o delineamento de um desejo sexual. Estamos falando de um ano que nos Estados Unidos ficou marcado pelas lutas raciais. Muitos cinéfilos e críticos já interpretaram as patrulhas de caçadores zumbis que aparecem nos atos finais como os equivalentes aos grupos de perseguição aos negros no sul dos Estados Unidos. Essa parece uma associação legítima, o que confere a chamada “crítica social” tipicamente presente no gênero.

O desfecho não é otimista, mas também não apocalíptico. Não há uma conclusão, mas permanece em aberto a sensação de anormalidade, de incidente.

Certamente, não é o melhor filme de zumbis já feito, mas a contribuição de A Noite dos Mortos Vivos é inegável. Exerceu influência no cinema trash americano e, curiosamente no italiano, consolidou uma concepção de filme de horror que ainda prepondera.

Com seus altos e baixos, temos um clássico, não absoluto ou indefectível, mas capaz de exercer fascínio ao espectador de hoje.

Bem, acho que já está na hora de ler Max Weber.

Cotação: Regular

30 de novembro de 2009

sábado, 4 de abril de 2009

Fome animal


Fome Animal (Dead Alive), 1992. Nova Zelândia. De Peter Jackson

Tem filme que foi feito por cinéfilo e para cinéfilo, o público usual simplesmente não entende qual o fascínio uma produção ao estilo de Fome Animal é capaz de exercer.

Posso dizer que estamos diante de um clássico dos filmes de zumbis, possível e ironicamente o melhor trabalho de Peter Jackson, infelizmente mais conhecido por ter contado uma história sobre garotos descalços, anéis e elfas peitudas...

Um filme cheio de citações divertidíssimas: vemos um rapaz filho de uma mulher castradora, eles moram em uma casa no alto da colina (Psicose). Também vemos um carrinho de bebê meio sinistro, em seu interior esconde-se uma assustadora criatura (O bebê de Rosemary), isso sem falar do diálogo – se voluntário ou ao acaso, isso não importa – com o excelente A morte do demônio de Sam Raimi.

Lionel é um bom rapaz, porém facilmente dominado pelas pessoas, sobretudo se forem mulheres. Além de ser tiranizado pela sua mãe ainda há os encantos da jovem Paquita – cujo nome, carinha e atuação parecem lembrar os atributos de uma atriz pornô.

Entretanto, um raro macaco da Sumatra (!) mordisca o braço da mãe de Lionel, a Senhora Cosgrove, que se transforma em um... isso mesmo, não precisa nem continuar...

Essa grotesca velha desenvolve uma apetência bem incomum, atacando várias pessoas ao seu redor e, naturalmente, infectando-as. Enquanto isso, a versão neozelandesa de Norman Bates (personagem de Psicose) esforça-se para conter sua genitora e as pessoas por ela agredida, mas sua inépcia faz com que os problemas assumam dimensões cada vez mais desastrosas.

Vale lembrar que Peter Jackson se preocupa em fornecer todos os detalhes para o espectador. Um navio negreiro parou em uma Ilha da Sumatra, ratos gigantescos desceram e estupraram as macacas nativas, desse cruzamento surgiu uma rara espécie capaz de transmitir a peste dos mortos vivos. Quando um desses animais é capturado e levado ao zoológico da Nova Zelândia, os problemas começam. A história se passa em 1957, o que acresce um ar especial ao cenário, ao retratar um modo de vida bem ao estilo do American Way of Life.

Os personagens são muito bem desenvolvidos, mesmo aqueles que aparecem em uma única cena cumprem seu papel, ao exemplo do veterinário nazista. Mas bacana mesmo é o padre que decide “Dar porradas nos zumbis em nome de Deus” ou algo do gênero.

Podemos dizer que Lionel Cosgrave é o oposto de Ash Willians, o personagem do já citado A morte do demônio, um conquistador de mulheres que não tem pejos em mandar os possuídos para o outro mundo. O protagonista de Peter Jackson, no entanto, só se aproxima do seu contra-exemplo nos momentos finais quando, de posse de um cortador de gramas, passa a proferir frases de efeito ao estilo do nosso querido Ash.

O confronto final fica por conta de Lionel com sua mama, que tenta devolvê-lo ao seu ventre, de um jeito ou de outro. Mas até chegar nesse momento, todos os exageros do gore terão sido mostrados... dando enjôos nos estômagos mais fraquinhos e desavisados.

Um filme primoroso, mas que infelizmente tende a agradar somente os fãs do gênero ou os cinéfilos de carteirinha.

Ainda bem que não sou nenhum desses dois...

Cotação: Ótimo

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Extermínio 2

Extermínio 2 (28 weeks later), 2007. Inglaterra. De Juan Carlos Fresnadillo


Da ordem ao caos, do caos a ordem e, da ordem, novamente ao caos.

A frase acima ilustra muito bem o sentido de Extermínio 2, uma excelente continuação do trabalho inicial de Danny Boyle. Nesse filme são abordadas as tentativas da reconstrução de Londres, 28 semanas após o incidente inicial da propagação do vírus.

O exército americano invadiu a Inglaterra, cabendo a si a responsabilidade de reconstrução. Os nossos bons ianques dão como certo a extirpação da doença e a eliminação dos infectados. Portanto são criadas zonas de segurança para o retorno dos refugiados.

Infelizmente, para os sobreviventes ingleses, os americanos são uma péssima tropa de ocupação (vide Vietnã, Afeganistão e Iraque). Como metáfora sócio-política, o filme alcançou seus objetivos, ao mostrar a inépcia dos americanos em administrarem uma zona pós-guera e como seu descuido e truculência atingiram resultados inversos aos esperados.

Quando a reinfestação começa, vemos a disposição do exército em eliminar todos, os infectados e os sãos (em uma atitude que seria congratulada pelo secretário de segurança do Rio...). Mas, é importante frisar que o filme não é maniqueísta, os americanos são bem intencionados, mas, ao se deparem com o caos, o desespero é inevitável.

Inclusive, é curioso pensarmos que neste filme temos uma novidade: o deflagrar de uma nova onda de contaminações era uma possibilidade prevista, daí a existência do esquema de segurança “Código Vermelho” – nos filmes tradicionais, a irrupção dos zumbis era uma imprevisibilidade, dificultando a organização de sistemas defensivos. Caberia entendermos como militares com armas e em prontidão puderam ser derrotados, mesmo com um planejamento prévio. O que temos é uma representação da falência do estado e de sua incapacidade para gerir o conflito civil.

Extermínio 2: uma continuação ou um recomeço?

De fato eu não esperava que a segunda versão tivessem muitas relações com o trabalho original, sobretudo ao saber que os atores e o diretor seriam trocados. Eu já estava esperando a carnificina sem sentido, ao ritmo de Resident Evil. Mas há uma unidade muito grande entre esses dois filmes: os planos gerais da cidade (revelando a desolação ou o recomeço), a fotografia azulada e melancólica (lembrando uma triste manhã de inverno) e o enfoque no desespero dos personagens. Além disso, como um eixo transversal, nos dois casos, teríamos uma trilha sonora similar, alucinada, mas não frenética.

Há algumas falhas no roteiro, entretanto, no próprio Extermínio 1 (28 days later), também existiam problemas, sobretudo na segunda metade, a ponto de alguns falarem em cada metade ser um filme diferente. Já na continuação, a coesão entre os capítulos é bem maior, ainda que o clímax deixe a desejar, resultando em um desfecho abrupto, que quase trai a premissa original. O confronto final, se é que podemos usar esse termo, não é marcado pela proliferação dos “zumbis”, mas sim por um único infectado que é a peça chave da trama.

Personagens: vítimas do caos

Além da crítica a ineficácia militar, a reflexão mais evidente se relaciona a sacralidade da família: ela é uma instância capaz de resistir às pressões da barbárie? Mais de uma leitura pode ser detectada. O enredo se desenvolve justamente a partir de uma cena em que um marido não hesita em abandonar sua esposa a horda de canibais. Arrependido e torturado por sua fraqueza, mais completamente ciente de que no momento do caos e horror a auto-preservação prevalece. Sua consciência é outra peça chave para o desenvolvimento do argumento central.

A principal falha de 28 weeks later reside na quantidade de personagens que dividem os atos. Inicialmente, é difícil sabermos quais serão os eleitos para a sobrevivência e só no meio da narrativa entendemos qual é a escolha feita. Chega a ser decepcionante vermos personagens mais interessantes serem abandonados em proveito de dois adolescentes. Talvez a última tentativa de defender a possibilidade de uma inocência e regeneração.

A globalização do desespero

O final de Extermínio 2 é o encontro com o prólogo de Madrugada dos Mortos. O que é uma pena, pois a singularidade desse trabalho era justamente enfocar na univocidade da experiência inglesa. A possibilidade do vírus sair da ilha, abre um novo caminho a ser explorado, derrubando as certezas de um porto seguro para a civilização. Mas é esperar para ver, por hora, cabe refletir porque as temáticas dos zumbi retornaram com força no cinema hegemônico e mesmo em produções semi-independentes.

Interesse pela crítica social? Ou simplesmente um sentimento de desolação e abandono causado pelas perversidades da globalização?

Cotação: Bom

domingo, 21 de outubro de 2007

Fido - o mascote

Fido – o mascote (Fido), 2006. Canadá. De Andrew Currie.

Enquanto os intelectuosos ficam a discutir se Tropa de Elite é a reinvenção do fascismo ou a profissionalização das baboseiras nacionais, o verdadeiro cinema passa despercebido pelas salas de exibição do circuito belorizontino.

Entretanto, cabe acrescentar, que para chegar ao cinema – que fica no Buritis, a favela rica de B.H – tive que pegar um ônibus, metrô, outro ônibus, e para voltar foram necessários um táxi, metrô e finalmente um último ônibus. E olha que o filme terminou às nove horas... Ou seja, o verdadeiro e pululante cinema está escondido nas medíocres salas dos bairros classe média.

Mas, não nos alonguemos nessas divagações. Porque eu assisti Fido, e tudo está bem.

O filme é ambientado nos anos cinqüenta, abordando o American Way of Life: waffles no café da manhã, família nuclear reduzida, mamãe com um inocente vestidinho (pero, muy sexy), papai que chega cansado do trabalho e... zumbis.

Essa produção, praticamente desconhecida, aborda uma temática pouco usual, o Dark American Way of life, com um enfoque que, senão brilhante, ao menos é muito eficiente.

O filme parte de premissas conhecidas sobre o gênero dos zumbis. As referências mais evidentes são aos trabalhos de George Romero, sobretudo O dia dos mortos (1985) e Terra dos Mortos (2005), outro título que também perfaz o diálogo é Shaun of the dead (2004), além, claro, de Plano nove do espaço sideral (1959).

Uma poeira cósmica (yes!) cobre a terra, animando os cadáveres, é quando ocorre a Zoombie War, que cronologicamente, eu presumo, estaria no lugar da Segunda Guerra Mundial. Nesse conflito entre vivos e quase vivos, os primeiros levam a melhor, conseguindo fortificar suas cidades e criar uma coleira que, quando colocadas nos zumbis, os domesticam. Entre as cidades fortificadas existiriam zonas livres, habitadas pelos mortos selvagens.

No interior das cidades, os zumbis se tornaram escravos, executando tarefas de jardineiros, entregadores de jornais, leiteiros, etc. Porém, quando as pessoas morrem (indendente da causa mortis), são reanimadas automaticamente como zumbis;já em outras situações os prisioneiros conseguem se libertar, ocasionando novo ciclo de mortes. É nesse momento que entra em ação a Zomcom, uma empresa voltada para a segurança contra os mortos vivos.

É dentro desse painel complexo e fascinante que conhecemos a família dos Robinsons, encabeçada por um pai que tem pavor de zumbis. Ele sofre uma dupla pressão, por viver no American Way of Life e também por está à mercê dos canibais. O personagem mais interessante do filme, seu olhar é angustiado, mal consegue saudar seu filho, pois ele não quer se apegar a ninguém, pois qualquer um pode se transformar em um zoombie. Seu maior divertimento é ir ao funeral, para ver as cabeças dos mortos serem enterradas. Tal personagem é obcecado pela morte, ele anseia deixar de existir definitivamente, seu maior receio é a morte em vida.

A esposa adaptou-se àquele desumano mundo, ela almeja os valores de uma sociedade consumista e exibicionista (ter muitos escravos é sinal de status), muito embora ressinta o fato do seu marido viver afastado, por temer tanto a vida quanto a morte. Essa senhora, uma excelente releitura de algumas heroínas da cinematografia clássica (vide suas frases inspiradas ao longo da projeção), comprou um zumbi (chamado de Fido) para lhe auxiliar nas tarefas do lar.

Não nos esqueçamos do protagonista, Timmy, o filho do casal. Um isolado, que, se não teme aos mortos vivos, também não aprecia o mundo em que vive. É esse jovem americano – abençoado por Deus – que irá travar amizades com Fido e colocar toda a cidade a beira do holocausto zoombie.

O filme desenvolve muito bem a premissa de uma sociedade sádica construída sobre a exploração dos mortos – que pode ser entendida como uma metáfora da opressão sobre os pobres, os trabalhadores, os imigrantes etc. Em um universo como esse, a morte recebe outro redimensionamento, há várias cenas em que pessoas são assassinadas, afetando muito pouco as sensibilidades dos personagens. Outro ponto de destaque é a insinuação do potencial necrófilo daqueles que optaram por controlar seus mortos – afetos para com os zumbis são menos incomuns do que se pensam.

A própria esposa dedicada, não deixa de trocar uns olhares (e que olhares) com o bom Fido – o zumbi quase bonzinho do filme. Uma relação quase adúltera, Beleza Americana, mas com defuntos...

Nos filmes clássicos de zumbis, o sentimento que impera é o do caos e do retorno a um estado de barbárie. Nessa produção, os humanos conseguem por ordem ao apocalipse, transformando os inimigos em, digamos, aparelhos celulares: dão problemas, mas, ainda sim, não ficamos sem eles. É o reflexo do cinismo atual, da crença de que as mega-corporações são indestrutíveis, suas mentiras são convertidas, por meio de manipulação de informações, em verdades.

O desfecho é um happy-end, se não nos importarmos com o individualismo em voga. Esse filme, tão modesto em suas intenções, é uma sutil alfinetada nessa vidinha da class media. E quando eu penso no Buritis, nos cinemas nos shoppings, nas linda famílias endinheiradas nas praças de alimentação, eu me convenço, cada vez mais, que há muita carne a disposição dos mortos vivos.

Fido, pega!

Cotação: Bom

Seres Rastejantes

Seres Rastejantes (Slither), 2006. EUA. De James Gunn

Para assistir esse filme, em uma noite de domingo, tive que passar por vários percalços como enfrentar a parada gay de Contagem-MG (com homossexuais e evangélicos se provocando), suportar um mega engarrafamento, aturar uma inoportuna garoinha de inverno e voltar em um ônibus cujo sinuoso percurso era quase um quadro de Kandinsky.

A pergunta é: valeu a pena?

Em parte sim, Seres Rastejantes escrito e dirigido por James Gunn é algo entre a ficção científica e o horror, no estilo de filmes como A coisa, A bolha assassina e Criaturas. O esquemão é o mesmo: algo vem do espaço e passa a se expandir; desta vez, trata-se de uma “lesma alienígena” que chega à Terra dominando a mente das pessoas e transformando-as em zumbis telepaticamente conectados.

Não há muitas surpresas, tudo é previsível, em parte por isso mesmo a história é curta, 95 minutos. Uma opção interessante para quem quer reviver o “cinema B”.

Acho que James Gunn fez um trabalho satisfatório. Ele é conhecido como escritor de ficções científicas, autor de Os vendedores de felicidade, uma interessante história sobre uma sociedade condenada a ser feliz. Também é de sua autoria a adaptação do roteiro de Madrugada dos Mortos. Suas colaborações no cinema são freqüentes e, de um modo geral, adequadas.

Não sei se os “sustinhos” que tive compensaram minha Via Crucis para chegar ao cinema, mas de qualquer forma quando as luzes se ascenderam saí com aquela agradável sensação de final feliz.

Escapismo? Por que não?

Cotação: Regular