domingo, 16 de abril de 2017

Sandy Waxler





Sandy Waxler, 2017. EUA. De Steven Brill.

Vez ou outra aparece o entendimento de que a indústria do entretenimento vai bem, pois nunca se investiu e se lucrou tanto quanto nos tempos presentes. Por essa perspectiva, os serviços de streaming exemplificariam a democratização da cultura e do lazer, pois haveria todo um acervo de experiências válidas e legalizadas acessíveis a partir de um clique.

Tal entendimento, no entanto, está longe de ser verdade e as evidências contra isso falam por si só! É o caso do irregular Sandy Wexler (2017), protagonizado pelo Adam Sandler e produzido e lançado diretamente no Netflix. O filme se passa nos anos 90 – o novo filão a ser explorado pelos nostálgicos – na cidade de Los Angeles, onde um empresário tenta projetar a carreira de clientes pouco talentosos.

Adam Sandler é Sandy Wexler, um caricato e carismático empresário. Ele se assume como “bobão” de fala arrastada, visual brega (mesmo para os anos 90) e comportamento antissocial. Mas fica a dúvida se Wexler é de fato um incompetente; a insistência em mostra-lo como desajustado não harmoniza com a sua facilidade de circulação nos círculos dos famosos, sempre encontrando colegas ou amigos que alcançaram o sucesso no show business.
 
É este o ponto que pretendo destacar, a autocongratulação de Sandy Wexler ao streaming. Há um conjunto recorrente de alusões e piadas que contrapõe os anos 90 aos “dias de hoje”. Possivelmente a intenção é vangloriar a possibilidade de sucesso para qualquer um que tenha talento – no plano de fundo encontra-se o autoelogio às plataformas do Netflix e do Youtube.

Sandy Wexler se propõe a fazer o que as redes sociais, os blogs, e os canais de vídeos hoje o fazem: tirar as pessoas do anonimato e dar-lhes o tão cobiçado reconhecimento.

Tanto que o ponto forte do filme baseia-se nas ironias contra aquele mundo anterior à universalização da internet. Waxler elogia a Blockbuster, desconhece o correio eletrônico e faz pouco caso da Pixar. Ou seja, como um genuíno homem dos anos 90, ele supõe que é no tête à tête e na articulação de contatos que se encontram as portas para o show business. A internet seria, naquele contexto, uma brincadeira de nerds.

Mas tendo em vista que a maior parte dos clientes de Waxler são nulidades (ventríloquo, malabarista, lutador de Westler) do mesmo naipe de muitas subcelebridades que hoje não abrem mão dos seus 15 minutos de fama, cabe o questionar se, afinal de contas, tal democratização da cultura seria a própria universalização do mal gosto e do apego aos pastiches.

Pois se o que a indústria cultural tem a oferecer (como algo original e feito diretamente para o streaming) é Sandy Waxler, fica desculpada a tendência de rememorar a década de 90.

Cotação: Regular

domingo, 9 de abril de 2017

Muppets 2





Muppets 2: Procurados e Amados, 2014. EUA. De James Bobi

A composição cênica resultante do uso de fantoches no “mundo real” assinala a tensão insolúvel dos Muppets. Trata-se de um universo ficcional no qual os humanos coexistem com fantoches de animais antropomórficos sem que tal irracionalidade seja percebida. Desse modo, a narrativa encontra-se tensionada pelo absurdo, até mesmo porque os recursos metalinguísticos exploram a natureza cômica de tais contrassensos.

O enredo não traz nada de novo: amontoados de clichês articulados de forma pretensamente divertida. Enquanto os Muppets encontram-se em uma turnê mundial (leia-se europeia), um audacioso roubo é planejado. O sapo bom, Kermit, é preso na Sibéria e substituído pelo sapo mau, Constantine, a fim de que a trama maligna seja colocada em movimento.

As temáticas banais e lacrimejantes sobre a amizade, a família e o amor verdadeiro são utilizadas mais uma vez. Tudo adoçado com poucos momentos cômico e números musicais irregulares – revelação de que os Muppets se tornaram um pastiche de si mesmos. Nem mesmo Ricky Gervais, interpretando um dos vilões, consegue se apropriar do potencial humor non sense da narrativa.

Na verdade, o valor do filme se baseia no tipo de subtexto construído a partir da irracionalidade já apontada. Isso nos leva a questionar nas causas da insistência em uma comédia de fantoches para adultos (ou pelo menos para “todas as idades”). A poética infatilóide de Muppets 2 denuncia as dificuldades de coexistência entre o saudosismo e o burlesco. O resultado é o enfraquecimento da comédia e o apelo à lembrança de que já houve um dia no qual todos podiam sorrir dar tiradas inteligentes de um sapo de pano.

Firma-se mais um monumento da crise da comédia hollywoodiana contemporânea.

Cotação: Fraco

Café com Cinema versão 2017



Os tempos são outros, mas retorno. Há uma razão para isso e não é o tédio.

Apesar de ter perdido a cinefelia retorno porque sinto a vontade de escrever sobre a banalidade do cinema contemporâneo. O “empoderamento feminino” transformado em paradigma de Hollywood, o insistente multiculturalismo bem comportado, o desaparecimento da comédia como elogio ao absurdo e o apego aos heróis como os únicos agentes sociais possíveis.

Estou velho e dei para dormir nas salas de cinemas ou no sofá, diante da televisão conectada ao Netflix. Talvez não devesse insistir... Além disso, há uma garotada barulhenta a qual não deve ser dado o direito de comentar.

São muitos incômodos, bem sei. Mas só há uma maneira de enfrenta-los, com café e cinema. Estão avisados, já sabem o que esperar.