domingo, 27 de junho de 2010

Esquadrão Classe A


Esquadrão Classe A (The A-Team), 2010. EUA. De Joe Carnahan

Ideologicamente asqueroso e com fortes tendências para o narcisismo.

Esquadrão Classe A faz a invenção de um mundo no qual a tônica das relações humanas, em seus mais diversos matizes, nos é dada pelo militarismo americano. Somos brindados com o capítulo introdutório, em que soldados ianques participam de uma missão secreta no México, atuando como policiais.

Analogia auto-explicativa, ao sul do Rio Grande, prevalece a criminalidade, o exército mexicano, corrupto e ineficaz, merece ser confrontado por soldados de elite, tão brilhantes quanto heterodoxos.

Quando os papéis já estão distribuídos e o público acostumado à dinâmica dos próximos 110 minutos, vemos os personagens no Iraque, participando das forças de ocupação. Após a execução de uma missão muito arriscada, Esquadrão Classe A é acusado de um crime que jamais cometeu e daí os honrosos milicianos partem para provar suas inocências.

O roteiro elege os atributos do imaginário militar, a purpurina verde-oliva, como as verdadeiras qualidades do guerreiro moderno, a começar pelo total descaso com a vida humana... Há momentos preciosos, de anteposição entre as Forças Armadas e os exércitos. O discurso prevalecente assevera a hombridade dos militares em relação aos civis e aos serviços de inteligência.

Subjaz por trás desse discurso (talvez panfletário) certa crença otimista de que os problemas políticos teriam melhor solução quando resolvidos militarmente. Temos que pensar no público alvo do filme, o americano padrão, que tem uma bandeira dos Estados Unidos afixado a sua porta.

E única e exclusivamente por isso, vale a pena nos determos em Esquadrão Classe A, já que do ponto de vista da narrativa fílmica há um desmoronamento de todas as premissas iniciais. Os verdadeiros inimigos confrontados não são nem os mexicanos (pobres e feios) e nem os árabes (ricos e terroristas anti-libertários), mas sim funcionários do aparelho de Estado Americano, do exército inclusive.

Exercício de psicanálise amadorística: o “inconsciente” do filme está reconhecendo que os americanos são os construtores dos problemas que alegam resolver. O plot “traidor” é altamente eficaz: joga-se todo o crime das instituições em um bode expiatório.

Cinematograficamente medíocre, ideologicamente asqueroso, mas um excelente registro da visão narcisista norte-americana. Um filme em que Ghandi é citado como para legitimar a violência física merece tão somente a indiferença e o esquecimento. Porque é um filme bobo, feito por gente boba e para gente boba. E só.

Cotação: péssimo

27 de junho de 2010

sexta-feira, 25 de junho de 2010

O Fantástico Sr. Raposo


O Fantástico Sr. Raposo (The Fantastic Mr. Fox), 2009. EUA. De Wes Anderson

O que é a civilização? O que é deixar-se de ser selvagem?

Tais questões atravessam o atraente filme de Wes Anderson, diretor que tem uma predileção muito conhecido pelos exóticos e excêntricos.

Uma animação feita para adultos, onde Sr. Raposo, o protagonista, vive preso em um terno, trabalhando em um emprego medíocre para sustentar sua família suburbana. Residindo nos limites do bosque, a visão de sua janela dá de frente para as propriedades dos três maiores fazendeiros da região: um criador de galinhas, outro de gansos e um irascível e astucioso produtor de cidra.

Aquela paisagem desperta nesse excêntrico vaidoso um sentimento bem familiar às raposas, evocativo dos seus tempos de ladrão de galinhas. Não resistindo à tentação, ele elabora um plano para assaltar os três fazendeiros, ridicularizando-os e confirmando sua notória esperteza.

Não obstante os ternos e os maneirismos humanos, bem como a precária civilização constituída no bosque (com escolas, escritórios de advocacia e lojas de 1,99) os animais ainda são feras e ressentem a situação em que vivem, distante dos seus instintos primários.

Sr. Raposo é sem dúvida o mais corajoso, ou melhor dizendo, aquele que aceita a sua verdadeira essência. Há mais de uma ocasião em que ele pronúncia:

“No final das contas sou só um animal selvagem”.

Seu desejo, portanto, situa-se ao nível da identificação com suas origens, um encontro com sua ancestralidade. E nesse sentido o filme se estrutura quase que como um apelo anti-civilizacional. Apesar dos pedidos da Sra. Raposa, ele negligencia o bom senso, motivado pelo anseio em ser livre e cumprir sua razão de ser.

No entanto, não há como se enganar, esse ladrão de galinhas, que entra furtivamente no galinheiro é o verdadeiro herói. Em momento algum se propõe a destruir a espécie das galinhas, busca somente satisfazer suas vontades predando uns poucos espécimes. Bem diferente dos fazendeiros, que decidem destruir todo o bosque na tentativa de uma desforra pela ação ousada do Raposo.

A civilização, no fim das contas, mostra-se mais bárbara que a própria selvageria. Quando os tratores avançam contra a floresta, as escavadeiras levantadas assemelham-se a mandíbulas, com dentes enfileirados e ameaçadores. Muito mais que os caninos do Raposo, que também insistem em aparecer, mesmo nos mais inocentes sorrisos.

O filme conta com uma galeria de animais não tão interessantes, o destaque fique para Raposo, seu próprio filho enfada com o estereótipo do adolescente ressentido em busca do reconhecimento paterno. A vaidade das raposas permanece como temática essencial, metaforizando a beleza e os estratagemas da natureza, em contraponto com a frialdade da civilização.

Nos atos finais, subtende-se que os animais estão fadados a morrer – cercados pelos fazendeiros e entocados no esgoto. Mesmo com consciência de tal inevitabilidade não se abatem, deleitando-se com as pequenas vitórias, fazem um banquete às custas da civilização.

No fim das contas, reconhecem que a existência nada mais é que uma sobrevivência.

Cotação: Bom

25 de junho de 2010

domingo, 11 de abril de 2010

Uma noite fora de série



Uma noite fora de série (Date Night), 2010. De Shawn Levy.

A discussão já amarelada se a comédia é universal pode ser inutilmente retomada nesse filme protagonizado por Steve Carrel e Tina Fey. História que talvez seja divertida para casais bolorentos com mais de quarenta anos e que ainda querem ter esperanças de que estão vivos. Além disso, a piada principal (básica e recorrente) são as discrepâncias entre a mesmice dos subúrbios de New Jersey e o caos da Town nova-iorquina.

Caso essa chave inicial não seja apreendida, Date Night será tão somente um desfilar de situações inusitadas, bobas e bem comportadas. O mecanismo que move a história é o mal entendido, casal suburbano confundido com casal de ladrões, esse non sense tenta sustentar as pontas de uma narrativa sem ritmo e descompassada, mas com uma falha fundamental, esquecer-se de dar lugar a verdadeira protagonista: a vida noturna de Nova York.

Em 1987, Crhis Columbus dirigia Adventures in babysitting, comédia adolescente na qual uma babá de 17 anos perambulava pelas ruas da cidade tentando escapar de criminosos enquanto procurava pela amiga presa na rodoviária. Filme que conseguiu mostrar os fascínios e perigos da vida “subterrânea” de uma metrópole.


[Adventures in babysitting e Date Night, a noite de N.Y certamente não foi feita para os habitantes dos enjardinados bairros de New Jersey]

A constatação de que as grandes cidades se transformam na noite profunda é tema das tradições literárias e cinematográficas. Basta lembrar os cronistas urbanos do século XIX (com suas “fisiognomias”) e o provocativo filme de Martin Scorcese, Depois de horas (1985).

Bem, a história protagonizada por Steve Carell não consegue nem ter a ingenuidade de Columbus e nem o humor negro de Scorcese. Tem um público alvo bem específico, que a rigor nem brasileiro é; a classe média suburbana americana indiscutivelmente entedia qualquer um e suas desventuras podem nos soar bem indiferentes. Oscilando entre o quase besteirol e a terapia de casais, Date Night consegue ser aquilo que o casal do filme parece evitar a todo custo.

Insosso.

Cotação: Fraco.

11 de abril de 2010