sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Editorial

O cinema como um exercício de consumismo

Shopping de luxo. Meia noite, a fila está cheia. Mais do que cheia, transbordante. O cheiro de pipoca está espalhado por todo o ambiente. O público é heterogêneo, mas muito farofeiro e afeito a balbúrdia. Famílias inteiras, grupos de amigos, casais de namorados. Não há espaço para o telespectador solitário. É noite de estréia da última parte de Piratas do Caribe.

É muito barulho, algumas pessoas estão até vestidas a rigor, com espadas e escudos. Os adolescentes realmente parecem uma falange. 14 horas. Cinema de shopping, região metropolitana de B.H. Lá fora, sol a pino, lá dentro, desolação infinita. Há uma confusão, a cada minuto chegam novos espectadores, dispostos a furar fila e a engrossar no coro dos histéricos. O filme é 300.

Público diversificado. É num dos shoppings mais centrais de Belo Horizonte. 17 horas. Há muitos casais de namorados. Não é dia de estréia, mas é a primeira semana de exibição de Harry Potter 5. O falatório é estardalhoso. De um modo geral, estão mais preocupados com a pipoca, a projeção fica em segundo plano.

Duas semanas depois, as salas estarão vazias. O interesse cessado. Só então que os cinéfilos começarão, ainda que timidamente, a ousar penetrar nesse templo do provisório.

O que parece evidente é que o circuito comercial de cinema vive de modismo em modismo. Mantendo-se firme graças a cada nova temporada de blockbusters. Depois que os filmes vão para as locadoras ? ou mesmo passando as semanas iniciais de suas estréias ? as pessoas se esquecerão completamente das filas que enfrentaram e do desespero que expressaram para assistir a banalidade da vez.

Esse é o público geral, que escolhe os filmes movido pela campanha de marketing, pelo orçamento da produção, pela promessa de tiros e explosões ou então do exibicionismo de corpinhos sarados.

A busca de uma qualidade cinematográfica, salvo a excelência da produção, é ignorada. Não se escolhe um filme pelo seu diretor, pelos seus prêmios internacionais (uma forma de dialogar com a crítica), pela sua locação (só se vê filmes americanos) ou pela temática abordada.

O filme é, para o expectador comum, nada mais que uma prática de consumo. Uma oportunidade para botar uma roupinha bonitinha, gastar dinheiro com a pipoca, com a bilheteria e com a coca-cola.

No cinema se dão beijinhos. No cinema se dá bronca nos filhinhos. No cinema se atende o celular para resolver aquela pendência do trabalho.

O circuito comercial de cinema expressa, de forma admirável, a mediocridade do mundo contemporâneo, as imbricações espúrias entre arte e mercado. Não que os cinemas ?alternativos? também não tenham seus problemas. Mas nestes há pelo menos o esforço por uma fruição cinematográfica diferenciada.

Cinema medíocre exibido em ambientes medíocres para público medíocre. É um sistema bem consolidado. O espectador diferenciado tem que levantar a cabeça e respirar fundo, sob o risco de se afogar nesse lamaçal de nulidades.

É a pós-modernidade? Não, é só a mediocridade mesmo.

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