Não fale o mal (Speak no Evil), 2022. De Christian Tafdrup.
Filme
que aborda de forma brutal os convencionalismos do mundo moderno em meio a um
processo de corrosão civilizacional. É possível considerarmos as contradições
de uma Europa que teme a perda de seus pilares éticos e políticos por meio do
brutalismo contemporâneo. No entanto, foram os países europeus que guiaram o mundo a uma
destruição cultural em escala global, frisa-se bem.
Longe de tecer qualquer discurso de culpabilização é necessário apontar na narrativa a gestação de um senso de perigo para o ethos europeu. A história de uma família dinamarquesa “aprisionada” pelas regras de educação a permanecer na casa de uma outra família, esta holandesa, enquanto os indícios parecem sugerir a necessidade de ir embora imediatamente do luar. As boas maneiras perante os bárbaros, compreende-se, é arriscada!
Na
versão americana de O homem que odiava mulheres (2011) havia uma
reflexão sobre o risco de colocar o senso de civilidade acima da
autopreservação, algo também visto em Jogos de violência, tanto na
versão austríaca original (1997) quanto na americana (2007). Em Não fale
o mal essa situação é ampliada em uma trama-metáfora acerca da violência contemporânea.
O
filme também aciona o nosso senso de fobia social ao mostrar a excessiva
tolerância e passividade para com desconhecidos. Abrir-se demais pode ser arriscado. Isso é explicitado no trágico desfecho, quando um
subtexto referente ao multiculturalismo emerge e é escancarado no primeiro plano. Há um
personagem secundário de nome Muhajid que fantasmagoriza o islã como algo que
já está do “lado de dentro”. A narrativa também incorpora elementos sobre
mutilação e silenciamento dos mais frágeis podendo ser interpretado como uma
crítica à boa vontade para com a alteridade – leia-se o fundamentalismo islâmico.
Mostrando a impotência do bom senso, da razão e da educação perante a loucura e a maldade o filme atira o espectador ao senso do vazio. Há um mundo pedregoso, arenoso, estéril disposto a extinguir a vida e a drenar a beleza da civilização. Os europeus parecem temer os bárbaros do Terceiro Mundo.
Nós deveríamos, em nosso turno, recear o próprio monstro fascista que eles trazem dentro de si. E escrevo isso porque é preciso falar o nome do mal.
Cotação: ☕☕☕
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