quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

O homem do Oeste/Man of the West

O homem do Oeste. Man of the West. De Anthony Mann, 1958.

O fim do ciclo do Western é complexo, relacionando-se às mudanças de época e à forma de conceber as narrativas cinematográficas. A passagem dos anos cinquenta para os sessenta significou a revisão de paradigmas até então dominantes. Ao mesmo tempo, a linguagem cinematográfica passou a questionar suas abordagens, adicionando novas camadas de conflito e subjetividade nos personagens.

Esse é o caso de O homem do Oeste, um dos últimos filmes de Gary Cooper acerca dos dilemas de um ex-criminoso, Link Jones, acidentalmente envolvido com o antigo bando devido a um malsucedido assalto a um trem. Mesmo abandonando sua vida de crime, Link vê-se confrontado pelos outrora parceiros, agora interessados em seu retorno ao grupo. Esquecido na linha do trem com uma cantora e um jogador de cartas durante o assalto, Jones precisa fingir seu retorno ao crime para naõ ser morto. O líder dos bandidos é seu tio cruel, violento e com sinais de demência.

Observa-se na narrativa vários símbolos de decadência: os bandidos são degradados morais; o personagem de Cooper enfrenta a corrupção de precisar recorrer à violência. Há uma tensão profunda no personagem, apesar do seu distanciamento da vida criminosa ele não está livre do passado. No western, muitos os mocinhos são potencialmente bandidos e há até aqueles que sofrem com isso.

Jones precisa defender a cantora Billie Ellis de ser violentada pelo grupo, mas desarmado fica à mercê dos. Há mesmo um componente de terror e suspense quando ele e os outros dois prisioneiros são confrontados pelo tio, o velho Dock Tobin. A fragilidade do personagem mostra-se essencial para a construção de um clima de desespero.  A ausência do revólver no coldre é o sinal da castração.

As cenas com enquadramentos fechados e baixa iluminação conduzem o homem adulto ao tempo em que era um agregado do bando sob a dominação do tio. Esse arco de impotência vai permanecer até sua vitória na briga com um dos integrantes devolvendo sua viralidade. De dia e em um ângulo aberto, o filme abandona o aspecto mais sombrio ao afiançar a capacidade de justiceiro de Link Jones.

Porém o quadro de incerteza não está superado, pois o grupelho de decadentes celibatários atiçados pela presença da cantora é o resquício do Oeste selvagem. Perigo e decadência andam lado a lado, conforme se verá no projeto de furtar o banco de uma cidade mineradora. Os bandidos, no entanto, descobrem que a localidade foi abandonada e se tornou um vilarejo fantasma. Nesse ambiente de profunda decadência, casebres malcuidados, carroças abandonadas, terra árida, Jones poderá acertar as contas com os antigos comparsas em seu novo papel da justiceiro.

O tio permanece no acampamento, isolado com a prisioneira, ampliando o clima de ameaça e decadência. Provavelmente violentada pelo velho, o herói recebe, assim, a “permissão” para matar o próprio tio. Um entrelaçamento de situações beirando aos desfechos trágicos, impedidos somente pela capacidade do protagonista fazer apenas a escolha pelo caminho correto.

O aspecto sombrio do filme antecipa as ambiguidades do western tardio. Os próprios criminosos recebem uma parcela de humanização e é com relutância que o herói os elimina. Jones precisa recuperar sua potência, isto é, sua ação. O seu acesso à jovem como parceira romântica está fechado por ele ser casado e com filhos. A violência serve como válvula de escape das tensões e parece ser a única forma de afeto em uma família criminosa. Este é o Oeste que precisa ser esquecido.

Um Gary Cooper envelhecido vai tirar de dentro de si a energia necessária para transformar-se, mais uma vez, em herói, devolvendo Billie ao mundo da lei e da ordem. Ambos partem do Oeste sentido o vazio, pois a experiência foi profunda e não há muito a se esperar do fim da jornada. Afinal Jones ainda pode ser imputado como criminoso e a jovem sabe que ao seu lado está o último dos heróis.

Cotação: ☕☕☕☕

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