Stardust – o enigma da estrela (Stardust), 2007. EUA/Inglaterra. Matthew Vaighn
Na melhor das hipóteses é uma péssima comédia romântica escondida em um clima de fantasia medieval.
Porém, a maneira apropriada de se referir a esse filme é como a mais constrangedora história na mais medíocre direção.
Como desancar um filme tão ruim como esse? Começamos dizendo que existe um muro em um povoado inglês cuja abertura dá passagem para um (oh!) outro mundo. Outro mundo? Outro mundo! Outro mundo com:
Reis? Sim.
Princesas? É claro.
Bruxas? Pois então.
Artefatos mágicos que devem ser encontrados? Óbvio.
Unicórnios? Evidente...
Donzelas a serem resgatadas? Yes, you can believe!
Jovem plebeu que descobre seu valor e se torna príncipe? Sim, sim, sim e sim!
Todos os estereótipos, os clichês, os plots convencionais, os motes batidos estão reunidos nessa produção pessimamente dirigida. Basta lembrar a tendência do diretor em fazer vários planos de poucos segundos, com cortes abruptos e recomeços desordenados de outras cenas. O único momento em que ele se alonga é na exibição dos planos gerais, ao apresentar os cenários criados pela computação gráfica. O verdadeiro cinema para espetáculo: e o pior é que o público embarca na picaretagem, batendo palminhas para o patético herói e dando suspiros românticos nos poucos momentos em que ele dá uns apertos na Claire Danes, vulgo miss canastrona. A propósito, houve um momento em que me confundi, achei que estava no cinema assistindo Titanic (só faltou a frase I’m the king of world).
É um filme abrangente, tem de tudo. Um pouco de humor negro, gags físicas (reparem o momento em que o herói, sob um fundo musical grandiloqüente, se atira sobre a carruagem em movimento, mas é arremessado para outra direção – rá rá rá, que engraçado), pitadinhas de lição de moral (algo do tipo: “seja você mesmo”) e a clássica dinâmica da screwball (um casal que briga o tempo todo, mas que no final descobrem que foram feitos um para o outro – que lindo!)
Nada convence, as tramas são desinteressantes e previsíveis, basta lembrarmos que a motivação inicial do herói era buscar uma estrela cadente para provar seu amor para sua (suposta) amada. Isso sem falar que há bruxas em procura pelo rejuvenescimento, ou um príncipe em sua tentativa de ser rei.
Temos na verdade um Filme B, escondido em uma produção de primeira linha. Bons tempos aqueles de Ed Wood, quando a incompetência era explicitada no amadorismo e na ausência de uma composição cinematográfica. Hoje, ocorre é que o cinema da mediocridade é o mais badalado, enredos e narrativas que deveriam ser exibidas somente para crianças com dificuldades de aprendizagem recebem um verniz todo especial, posto a disposição de um público que adora ser ultrajado.
Piratas voadores, bruxas sensuais ou decrépitas, beldades das mais variadas, heróis bobalhões que redescobrem seu valor, furos no roteiro (por que o pai de Tristan nunca voltou ao outro mundo? Por que ele não tentou resgatar seu “amor”?). Enfim, o cinema elevado à enésima mediocridade, é como se fosse um falatório que não diz nada.
Espetáculo: barulhos, imagens. Soltem fogos de artifícios que o povão, esses morto-vivos, gosta!
Me desculpem se pareço desconexo, mas só agora percebo o valor de Terra dos Mortos de George Romero. Compreendo. É muito fácil distrair os zumbis com sinais luminosos, pois, afinal de contas, eles já não têm mais cérebros.
Cotação: Péssimo
segunda-feira, 15 de outubro de 2007
sábado, 6 de outubro de 2007
Bled Bumber One
Bled Number One (Back Home), 2006. Argélia. De Rabah Ameur-Zaïmeche
[Festival Indie 2007]
Eis um dos melhores filmes que eu já assisti.
Um filme constituído em cima de paradoxos e ambigüidades.
Ainda no começo do filme uma cena forte, que expulsou 10 por cento do público para fora da sala de exibição. Uma maneira direta de proclamar: “esse não é um filme ocidental”.
Kamel retornou da França. Chegando a Argélia, sua terra natal, ele percebe que lá não pode ser seu lar. Ele não consegue se adaptar, pois o Ocidente já o contaminou. Muito embora ele tente reconstruir sua identidade de mulçumano, a sua recusa àqueles valores é evidente.
É uma sociedade ambígua, presa entre o desejo de emancipação e as constantes reafirmações de uma moralidade mulçumana – na maior parte das vezes opressiva para com as mulheres.
Os homens querem o direito de ingerir bebidas alcoólicas e praticar jogos de azar, entretanto não aceitam que suas mulheres cantem em público ou se divorciem. Em alguns momentos pedem o relaxamento das Leis do Islão, mas em outra situações elas as reforçam.
Perdido nesse contraditório universo está Kamel, o duplo exilado. Ele nunca será francês, mas também não se transformará em um argeliano. Há uma certa obstinação em seu rosto, mas também um cansaço, uma resignação, uma aceitação perante as intransigências da vida.
O cenário em que a história se desenvolve é fabuloso. Uma paisagem terceiro-mundista, que não impressiona os já acostumados com as favelas brasileiras. Algo que os participantes do Festival Indie , representantes da classe média brasileira, não vão entender [vide o Editorial do mês].
O mais fascinante, no entanto, é a presença do “Ocidente” no filme. As referências são, às vezes, sutis, mas se fazem existentes. A música cantada em inglês e a canção de rock é uma ligação com todo um legado de modernização cultural vivenciado pelo mundo ocidental – que vai desde a laicização do Estado até a Revolução sexual e o feminismo.
O cineasta, sem muita piedade, revela facetas do mundo argelino, que transforma as mulheres contestadoras do Status Quo em loucas de sanatório, enquanto seus agressores ficam impunes.
Bled Number One é um filme para os argelianos, mas também para o ocidente. É um convite à reflexão, é um pedido de ajuda, é uma lufada de otimismo. Uma genuína expressão da ânsia de alguns, para que o mundo mulçumano vivencie a tão benéfica modernidade.
Cotação: Ótimo
[Festival Indie 2007]
Eis um dos melhores filmes que eu já assisti.
Um filme constituído em cima de paradoxos e ambigüidades.
Ainda no começo do filme uma cena forte, que expulsou 10 por cento do público para fora da sala de exibição. Uma maneira direta de proclamar: “esse não é um filme ocidental”.
Kamel retornou da França. Chegando a Argélia, sua terra natal, ele percebe que lá não pode ser seu lar. Ele não consegue se adaptar, pois o Ocidente já o contaminou. Muito embora ele tente reconstruir sua identidade de mulçumano, a sua recusa àqueles valores é evidente.
É uma sociedade ambígua, presa entre o desejo de emancipação e as constantes reafirmações de uma moralidade mulçumana – na maior parte das vezes opressiva para com as mulheres.
Os homens querem o direito de ingerir bebidas alcoólicas e praticar jogos de azar, entretanto não aceitam que suas mulheres cantem em público ou se divorciem. Em alguns momentos pedem o relaxamento das Leis do Islão, mas em outra situações elas as reforçam.
Perdido nesse contraditório universo está Kamel, o duplo exilado. Ele nunca será francês, mas também não se transformará em um argeliano. Há uma certa obstinação em seu rosto, mas também um cansaço, uma resignação, uma aceitação perante as intransigências da vida.
O cenário em que a história se desenvolve é fabuloso. Uma paisagem terceiro-mundista, que não impressiona os já acostumados com as favelas brasileiras. Algo que os participantes do Festival Indie , representantes da classe média brasileira, não vão entender [vide o Editorial do mês].
O mais fascinante, no entanto, é a presença do “Ocidente” no filme. As referências são, às vezes, sutis, mas se fazem existentes. A música cantada em inglês e a canção de rock é uma ligação com todo um legado de modernização cultural vivenciado pelo mundo ocidental – que vai desde a laicização do Estado até a Revolução sexual e o feminismo.
O cineasta, sem muita piedade, revela facetas do mundo argelino, que transforma as mulheres contestadoras do Status Quo em loucas de sanatório, enquanto seus agressores ficam impunes.
Bled Number One é um filme para os argelianos, mas também para o ocidente. É um convite à reflexão, é um pedido de ajuda, é uma lufada de otimismo. Uma genuína expressão da ânsia de alguns, para que o mundo mulçumano vivencie a tão benéfica modernidade.
Cotação: Ótimo
Editorial: Indie - Festival de Cinema
Zoológico.
Casais gays hardcores, casais heteros metaleiros, punks, hippies, aspirantes a modelos, playboys, black-boys, japan-girls. Em suma, toda a galeria de alternativos de B.H reunidos em um mesmo lugar, unidos por um mesmo evento.
Claro, e entre eles eu. O sujeito normal, o servente de pedreiro, aquele que gasta uma hora e meia para chegar até o cinema.
A fila para a retirada dos ingressos é quilométrica e suas chances de não assistir a sessão não são pequenas. Até mesmo porque os fura-filas são a espécie mais abundante do local.
Indie: Mostra Mundial de Cinema. Não entendo. Festivais como esse, ao invés de popularizarem o cinema, afastam o público normal, que se sentem constrangidos em dividir o mesmo espaço com essa fauna belorizontina.
Passei horas na fila, ouvindo todo um rol e besteiras pseudo-intelectualóides e proto-pretensiosas. Era o rapaz que dizia ter assistido Bertoulucci na França e que a tradução em português seria incapaz de transmitir a “essência última” do diretor. Então que diabos ele fazia naquela fila? Roubando meu ingresso, com certeza.
Era a menina loira do cursinho pré-vestibular, preocupada em assistir filmes que falem da globalização, ou então o aprendiz de Martin Luther King reclamando a pouca presença de filmes sobre o gueto (observação: a jaqueta dele alimentaria uma família do “gueto” inteirinha...).
Eu também tenho um sonho! E nele esse povo é mudo.
Esse festival só é freqüentado por aqueles que não precisam trabalhar, aqueles que têm tempo disponível para ficar uma hora fila da bilheteria e mais trinta minutos para entrar na sala de projeção.
Se isso é a democratização do cinema, que não se questione o império dos Shoppings centers!
Porém, ainda que o público seja sempre o mesmo é inquestionável a importância de oferecer um cardápio variado de filmes. Desse modo, o Indie é uma oportunidade para presenciarmos os cinemas de outros rincões do mundo – embora, por razões óbvias, eu ache excessiva a concentração de filmes norte-americanos e franceses.
Mesmo depois de anos, o Indie é somente uma promessa, e cada vez mais difícil de se realizar. Há de se modificar essa situação, redimensionando o uso desse espaço de exibições fílmicas. Que os falsos entendidos sejam enxotados do Usina Unibanco de Cinema e do Cine Humberto Mauro.
Xô falsos entendidos! Seus all-stars multicores, seus trejeitos artificiais, seus brincos escandalosos, suas tatuagens, suas camisas irreverentes não são bem vindos! Abram espaço que o povo quer entrar!!
Casais gays hardcores, casais heteros metaleiros, punks, hippies, aspirantes a modelos, playboys, black-boys, japan-girls. Em suma, toda a galeria de alternativos de B.H reunidos em um mesmo lugar, unidos por um mesmo evento.
Claro, e entre eles eu. O sujeito normal, o servente de pedreiro, aquele que gasta uma hora e meia para chegar até o cinema.
A fila para a retirada dos ingressos é quilométrica e suas chances de não assistir a sessão não são pequenas. Até mesmo porque os fura-filas são a espécie mais abundante do local.
Indie: Mostra Mundial de Cinema. Não entendo. Festivais como esse, ao invés de popularizarem o cinema, afastam o público normal, que se sentem constrangidos em dividir o mesmo espaço com essa fauna belorizontina.
Passei horas na fila, ouvindo todo um rol e besteiras pseudo-intelectualóides e proto-pretensiosas. Era o rapaz que dizia ter assistido Bertoulucci na França e que a tradução em português seria incapaz de transmitir a “essência última” do diretor. Então que diabos ele fazia naquela fila? Roubando meu ingresso, com certeza.
Era a menina loira do cursinho pré-vestibular, preocupada em assistir filmes que falem da globalização, ou então o aprendiz de Martin Luther King reclamando a pouca presença de filmes sobre o gueto (observação: a jaqueta dele alimentaria uma família do “gueto” inteirinha...).
Eu também tenho um sonho! E nele esse povo é mudo.
Esse festival só é freqüentado por aqueles que não precisam trabalhar, aqueles que têm tempo disponível para ficar uma hora fila da bilheteria e mais trinta minutos para entrar na sala de projeção.
Se isso é a democratização do cinema, que não se questione o império dos Shoppings centers!
Porém, ainda que o público seja sempre o mesmo é inquestionável a importância de oferecer um cardápio variado de filmes. Desse modo, o Indie é uma oportunidade para presenciarmos os cinemas de outros rincões do mundo – embora, por razões óbvias, eu ache excessiva a concentração de filmes norte-americanos e franceses.
Mesmo depois de anos, o Indie é somente uma promessa, e cada vez mais difícil de se realizar. Há de se modificar essa situação, redimensionando o uso desse espaço de exibições fílmicas. Que os falsos entendidos sejam enxotados do Usina Unibanco de Cinema e do Cine Humberto Mauro.
Xô falsos entendidos! Seus all-stars multicores, seus trejeitos artificiais, seus brincos escandalosos, suas tatuagens, suas camisas irreverentes não são bem vindos! Abram espaço que o povo quer entrar!!
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