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sábado, 6 de outubro de 2007

Bled Bumber One

Bled Number One (Back Home), 2006. Argélia. De Rabah Ameur-Zaïmeche

[Festival Indie 2007]

Eis um dos melhores filmes que eu já assisti.

Um filme constituído em cima de paradoxos e ambigüidades.

Ainda no começo do filme uma cena forte, que expulsou 10 por cento do público para fora da sala de exibição. Uma maneira direta de proclamar: “esse não é um filme ocidental”.

Kamel retornou da França. Chegando a Argélia, sua terra natal, ele percebe que lá não pode ser seu lar. Ele não consegue se adaptar, pois o Ocidente já o contaminou. Muito embora ele tente reconstruir sua identidade de mulçumano, a sua recusa àqueles valores é evidente.

É uma sociedade ambígua, presa entre o desejo de emancipação e as constantes reafirmações de uma moralidade mulçumana – na maior parte das vezes opressiva para com as mulheres.

Os homens querem o direito de ingerir bebidas alcoólicas e praticar jogos de azar, entretanto não aceitam que suas mulheres cantem em público ou se divorciem. Em alguns momentos pedem o relaxamento das Leis do Islão, mas em outra situações elas as reforçam.

Perdido nesse contraditório universo está Kamel, o duplo exilado. Ele nunca será francês, mas também não se transformará em um argeliano. Há uma certa obstinação em seu rosto, mas também um cansaço, uma resignação, uma aceitação perante as intransigências da vida.

O cenário em que a história se desenvolve é fabuloso. Uma paisagem terceiro-mundista, que não impressiona os já acostumados com as favelas brasileiras. Algo que os participantes do Festival Indie , representantes da classe média brasileira, não vão entender [vide o Editorial do mês].

O mais fascinante, no entanto, é a presença do “Ocidente” no filme. As referências são, às vezes, sutis, mas se fazem existentes. A música cantada em inglês e a canção de rock é uma ligação com todo um legado de modernização cultural vivenciado pelo mundo ocidental – que vai desde a laicização do Estado até a Revolução sexual e o feminismo.

O cineasta, sem muita piedade, revela facetas do mundo argelino, que transforma as mulheres contestadoras do Status Quo em loucas de sanatório, enquanto seus agressores ficam impunes.

Bled Number One é um filme para os argelianos, mas também para o ocidente. É um convite à reflexão, é um pedido de ajuda, é uma lufada de otimismo. Uma genuína expressão da ânsia de alguns, para que o mundo mulçumano vivencie a tão benéfica modernidade.

Cotação: Ótimo