domingo, 25 de janeiro de 2009

O Curioso Caso de Benjamin Button


O curioso caso de Benjamin Button (The Curious Case of Benjamin Button), 2008. EUA. De David Fincher

Hum... é uma picaretagem erudita, se você tiver imaginação e gostar dos dramas Hollywoodianos certamente sairá satisfeito com esse trabalho – muito bem produzido – de David Fincher. No entanto, Jack (1996) de Copolla, com muito menos recursos já nos havia contado uma história similar, mesmo que abusando do ingrediente “água e açúcar”. Tratava-se da história de um garoto que envelhecia mais rápido que o normal, e embora sua mente fosse de uma criança, o corpo era de um adulto.

Em O curioso caso de Benjamin Button temos o inverso, a história de uma criança que nasce velha e, no decorrer dos anos, vai rejuvenescendo, seu relógio biológico encontra-se invertido, empurrando-a da senilidade para a fase lactante. Porém sua mente segue o “ritmo natural”, isto é, sua idade mental sempre está em contradição com a idade física.

De fato, um caso curioso: o motor do filme, se é que assim se pode se expressar, e que dará o fio da meada para acompanharmos a trajetória de Benjamim Button (Brad Pitt) e a sua delicada relação com Daisy (Cate Blanchet). A história é contada do ponto de vista do protagonista, mas a narradora é a neta de Daisy que lê o diário de Benjamim para sua avó moribunda. Hollywood tem uma predisposição toda especial para colocar velhinhas no leito de um hospital (principalmente se forem sulistas), vide o “feminista” Telma & Louise e o constrangedor Ao entardecer (2007, de Lajos Koltai).

O curioso caso de Benjamin Button é consistente, tecnicamente primoroso, vide as ambientações e as próprias maquiagens. No entanto o desenvolvimento do roteiro não consegue escapar dos rocambolismos do gênero. Sofrendo da síndrome de “Forrest Gump”, o protagonista vivencia importantes lugares e eventos, tendo inclusive a chance de participar de um combate contra um submarino nazista, ocasião em que um reles barco rebocador de terceira categoria consegue derrotar (com alguns sacrifícios é claro) uma dessas poderosas máquinas de guerra dos malignos alemães.

Gump, digo Button, desde seu nascimento, quando é quase atirado em um rio, logo em seguida adotado por uma simpática funcionária de um asilo, tem como principal desafio conjugar sua idade física com a mental, na tentativa de alcançar um equilíbrio. Digamos, mentalidade de 17 anos e físico de 67 não é uma situação muito confortável, mas a decrepitude física não o impede de se relacionar com o mundo através da percepção própria de um jovem.

Pode se dizer que o filme seja a crônica de uma morte anunciada, com todos os elementos típicos desses melodramas refinados. As tragédias, os desencontros amorosos, os perecimentos e nascimentos, o “aprendizado de vida” e toda essa parafernália de lugares-comuns chics. Há no meu entender algumas falhas no roteiro, mas que não merecem ser citadas, para não dar ensejo ao previsível (mas não justificável) argumento de que se trata de uma fábula, no entanto, garanto que não vi unicórnios, salvo um ou dois beija-flores. A possível explicação para a singularidade de Button é desconexa e não liga nada com nada – antes tivesse sido descartada.

Curioso é que Button (ou Brad Pitt, sei lá) passa por um processo de “marlombrandomização”, com o decorrer das décadas (trazendo seu inevitável rejuvenescimento) suas aparências e trejeitos parecem sofrer a influência dos anos sessenta. Já nos atos finais temos um indômito motoqueiro (ei James Dean, adorei sua boina!), com algumas angústias existenciais possivelmente pertencentes a um rapaz de 24 anos ou a um respeitável senhor de 65 anos. Tanto faz, os homens nunca crescem mesmo...

Vítima de uma maldição ou talvez gratificado com uma benção, Benjamin tem dúvidas se cabe a ele a possibilidade de uma “vida normal”. Receia que, às vésperas de seu término, sua especificidade possa conduzi-lo a um final de reclusão e solidão. Mas apesar de toda a sabedoria adquirida, ele parece não entender que todo padecimento é solitário, que toda decrepitude é sôfrega. Em sua sinistra e radical democracia, a morte faz pouco caso se sua pele tem à aspereza octogenária ou o frescor do recém-nascido.

Bem produzido, mas pouco consistente. Criativo e até bem desenvolvido, mas falta uma seriedade a esse trabalho, para fazer jus à sua condição de cinema hollywoodiano classe “A”.

Cotação: regular

P.s: Acho que Ao entardecer não se passa no sul dos Estados Unidos, mas fica o dito pelo não dito.

A Última Noite


A última noite (Prairie Home Companion), 2006. De Robert Altman.

No filme tudo respira a passadismo. Claro, em parte é pela morte de Altman, que deu contornos a essa produção que talvez não existissem. É uma comédia triste.

Mas, não importa, a questão da finitude está indiscutivelmente presente em A última noite. A história é sobre a derradeira exibição de um programa de rádio, no ar por mais de trinta anos. A equipe, pessoas mais velhas na maioria, sentem que seu tempo está se esvaecendo. Isso fica evidente nas rememorações que fazem aos tempos antigos.

Um filme sobre um programa de rádio: um show de auditório ao vivo, resquício de uma época em que o som era principal meio de comunicação de massa. Um pé no presente e outro no passado. Assim é o filme e assim é o humor do filme, pois algumas gags são um tributo à antiga forma de fazer comédia. O segurança (e detetive particular) Guy Noir (Kevin Kline) tem maneirismos detetivescos completamente anacrônicos, próprios de um inspetor Clouseau. Há também outra forma de humor mais em voga, marcada pelos diálogos rápidos e estrutura de uma sitcom.

Os personagens, parece, não têm mais resistência para enfrentar a vida – seguros por um fio – estarão perdidos e abandonados quando o programa de rádio acabar; resta uma última noite. O show é a própria metáfora para a vida, por melhor que ela tenha sido, um dia tem que acabar. Essa constatação gera duas possibilidades para os personagens, aceitar a finitude ou relutar perante o fim.

Interessante é que Garrison Keillor (autor do roteiro) tem realmente um programa de rádio nos E.U. nesse molde. No filme ele interpreta a si mesmo e, curiosamente, parece ser o mais impassível perante o fim do programa. Estaria ele brincando com a inevitabilidade das mudanças e com seu próprio envelhecimento?

Há de fato um cansaço que perpassa por alguns atores do filme, Tommy Lee Jones, Meryl Streep e Lily Tomli. Justamente os veteranos. Já Kevin kline e Lidsay Loahan (so beautiful) são o outro lado da moeda. Mais jovens, principalmente essa última, são eles que menos rememoram, embora a narrativa seja o flashback de Noir, inclusive o único a tentar impedir o cancelamento do programa.

Os números musicais são bons, a trama em si é interessante, as atuações satisfatórias. Em suma, uma comédia inteligente, mas com uma tonalidade de crepúsculo. Ver que o último filme de Robert Altman é sobre o envelhecimento e o fim é quase premonitório e, de alguma maneira, metalingüístico.

O próprio filme termina em aberto. A morte, que dá as caras o tempo inteiro, parece ser a única coisa certeira. Entretanto, ela não é de todo inflexível, e muito menos temível. Há até uma certa comicidade em nossa relação com ela. Quem brinca com essas idéias já deve está pronto para o término, para o ponto final.

Roteiro e filme são maduros, papo para gente grande, pois trata-se de uma temática distante dos mais jovens. Aliás, distante entre aspas, pois a possibilidade do fim é igual, os mais novos que não compreendem essa fatalidade. Mas, se concordamos com o último filme de Robert Altman, o tempo dá um jeito nisso.

Sem cotação

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Marley e Eu

Marley & Eu (Marley & Me), 2008. EUA. De David Frankel

Li em algum lugar que arqueólogos já encontraram em ruínas romanas placas com inscrições em latim dizendo “Cuidado com o cão”, há muito tempo que esses animais vêm sendo usados como guardiões dos lares humanos. No ocidente, devotamos afeições aos cachorros já faz algum tempo; sem entender dess assunto apenas lembro que Machado de Assis, Jack London e Conan Doyle, entre tantos outros, têm contos nos quais esses animais são personagens.

No decorrer do século XX, sobretudo a partir de sua segundo metade, a antropomorfização desses “animais de estimação” foi crescente. Para muitos, os cachorros são membros da própria família e simbolizam, entre outros atributos, a fidelidade, a lealdade e o sentimento gregário que ronda a própria sociedade humana.

Portanto, um filme que aborde esses adoráveis animaizinhos tem tudo para cair no gosto do grande público. O adorável e branco e labrador Marley então, tem os quesitos básicos para se tornar a estrela do filme, também protagonizado por atores razoavelmente conhecidos como Owen Wilson e Jennifer Aniston. Estava parcialmente ciente de tudo isso quando entrei no cinema, talvez por isso não fraquejei perante as previsíveis manobras de David Frankel para nos fazer fã de Marley, the dog.

O rapaz sentado ao meu lado tinha cabelo raspado, por quê? Sabe-se lá. Talvez tenha passado no vestibular da PUC, talvez estivesse com piolho. Mas prefiro imaginar que se tratasse de um skinhead, que passou a tarde a espancar cidadãos de bem. Mas ao final do dia sentou na sala de projeção e foi tocado por essa magia canina, a ponto de chorar copiosamente. Bem, copiosamente é um exagero, mas que ele deu umas fungadas, lá isso ele deu. E nem me dou ao trabalho de mencionar os prantos do público feminino.

Mas não cabe censurar o rapaz, pois o filme esbanja sentimentalismos baratos, capaz de condoer até Cruela Devil – essa referência é gratuita, mas ao menos contextualizada. No mais, o filme expõe as desventuras de uma família americana e sua convivência com um simpático e bagunceiro cão.

Engraçadinho.

Cotação: Regular