Irmão, irmã. Ani imoto. De Mikio Naruse, 1953.
O filme
aborda as difíceis relações dentro de uma família camponesa enfatizando o embate
entre três irmãos: Mon, a moça mais velha que acaba se envolvendo com a prostituição,
San, a filha mais nova que tenta um casamento e Inokichi, o rapaz mais velho
que almeja ser o polo disciplinador da família. Seus pais mais idosos operam
como observadores passivos, incapazes de coordenar as tensões internas.
Um simbolismo
recorrente é a contraposição entre a água e as pedras, sugerindo a tensão entre
permanência e transformação. A cena inicial é um resumo visual da narrativa. As
pedras simbolizam os valores tradicionais e masculinos, a ordem patriarcal
resistente à transformação: o pai decadente e nostálgico e o filho bruto e
hipócrita. O riacho, por sua vez, é a mudança, o elemento que flui e precisa se
adaptar, tratando-se da representação do anseio feminino[DR1]
pela autonomia.
Outra
imagem visual forte é a barragem, modificando a relação dos barqueiros e dos pescadores
com a água. Tais imagens são sintéticas. Naruse resume bem o papel da
personagem feminina: em um mundo rígido, terroso, ela precisa encontrar a
fluidez. A correlação entre esses dois elementos, firmeza e flexibilidade, pode
fornecer a resposta para a fundação de um Japão moderno que não faça a tábula
rasa do passado.
O
pano de fundo sociológico enquadra a vida das pessoas comuns. No cinema japonês
esse tipo de melodrama é reconhecido como Shōshimin-eiga, constituindo-se
uma variação dos filmes Gendai-geki: dramas urbanos e rurais contemporâneos.
Os embates internos são duros e relevam a fragmentação da ordem familiar,
representação da própria sociedade japonesa do pós-guerra.
Como
expressão cinematográfica o filme revela uma força quase teatral, não economiza
nas expressões dramáticas para culminar na agressão de Inokichi a Mon. San é a possibilidade
de equilíbrio, uma operação feita, no entanto, com sacrifícios individuais. Ani
imoto constitui-se assim, um exemplar precioso do cinema de Mikio Naruse e
do esforço da cinematografia nipônica em se autorrepresentar.
Cotação: ☕☕☕☕☕